Mediocridade afetiva
De todas as mediocridades que assolam a raça humana, provavelmente, a
pior é a afetiva.
Algumas pessoas se gabam e se sentem superiores e mais espertas, maduras
e bem resolvidas porque oferecem amor a conta gotas. Não dispõe uma
migalha de simpatia e carinho com medo de desperdiçarem um pouco do seu
afeto.
Não sabem escutar, não sabem entender. E nem querem. Pior ainda.
Criticam quem escuta, quem entende. Acham perda de tempo pois escutar
problema não dá dinheiro, não é divertido.
Confundem amigos verdadeiros com parceiros para tomar chope de vez em
quando. Acham normal pularem fora quando um dos parceiros de barzinho
fica na pior. Não entendem e talvez nem queiram entender mesmo o valor
de uma amizade, o valor de um amor verdadeiro.
Não veem diferença entre uma transa por amor e outra para passar o
tempo. Não entendem que para alguns o amor é o ingrediente secreto do
sexo. Mais do que isso. Fazem troça dos românticos como se estivessem
num patamar superior: a terra do erotismo robótico.
Não se envolvem com ninguém. Não se comprometem por nada. Não conseguem
encarar uma conversa séria, uma crise afetiva, se apavoram diante de
qualquer profundidade. Optam pela superfície com orgulho, com um
arrogante sentimento de distinção.
Fazem tudo por etiqueta, porque os outros fazem. Não conseguem se
emocionar pra valer com nada. Podem até chorar diante de um filme
triste, mas não dão a mínima para quem sofre ao lado. Trabalham durante
anos com as mesmas pessoas sem conseguir desenvolver nenhum tipo de laço
verdadeiro com ninguém. Terminam relacionamentos como quem cancelam um
cartão de crédito. Encaram os amigos como meros companheiros para um
cinema ou uma festa quando não tem nada melhor para fazer. Entopem os
filhos de presentes caros para compensar a negligência afetiva. Não se
indignam com a miséria vivida por tantas pessoas. Acham que é normal
viver abaixo da linha da pobreza.
Os sorrisos são calculados. Trata as pessoas com simpatia controlada,
formal, protocolar, nada que vá além do verniz das aparências. Não
gostam nem desgostam. Vivem como zumbis emocionais ironizando tudo e
todos que brilham, que queimam.
Infelizmente a mediocridade afetiva está em moda. Não é à toa que tantas
pessoas estão assoladas pela depressão, pela extrema ansiedade, pelos
distúrbios alimentares. Talvez estas pessoas sejam as mais sãs porque
realmente é complicado demais viver cercado por tanta polidez
indiferente, por tanta cortesia gelada, por tantos sorrisos
inexpressivos, gentilezas mecânicas, palavras que não significam nada.
A vida se faz no encontro, nas relações que ultrapassam os limites da
epiderme. Quem se poupa demais, quem se protege demais, se livra da dor,
mas se priva também da alegria e do essencial da vida, que é
transformar e ser transformado pelas pessoas.
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