Cumpro, todos os dias, o que te prometi

Todos. Não há um dia que não me lembro. Não tem hora marcada. Não tem uma associação especifica. Passo a mão no teu anel e lembro-me de ti. Rezo para ti, porque gosto de falar contigo. Se durante o dia, ando com a cabeça ocupada, ao fim do dia, quando me sento, é inevitável lembrar-me de ti. Estás ali à minha frente. Coloquei-te ali, quando senti que te tinha perdido. Senti. Foi uma sensação inequívoca. Senti necessidade de marcar ali o teu lugar e assim foi. Todos os dias, quando me sento, fico de frente para ti. Falo contigo, num silêncio muito meu. Uma conversa a dois, no silencio. E por vezes com o teu neto, ao meu lado, choro. Choro porque penso em tudo o que deveria ter dito e não o fiz. Penso que deveria ter feito mais coisas e não o fiz. Penso que todo o amor que te dei, todas as vezes que te acariciei foram poucas. Vejo-te muito em mim. As minhas mãos parecem as tuas. O meu feitio, parece o teu. E isso é impossível de esquecer. Estás em mim, estás no meu filho, teu neto. Que tem os teus traços. E sinto sempre saudade. Penso sempre no quanto fui feliz, no muito que fizeste por mim, e eu nunca percebi. Percebo hoje. E percebo também que tento enganar-me quase todas as manhãs. Entro em tua casa, e evito ir ao teu quarto. Sento-me, tomo o pequeno almoço, e penso que estás ali, onde sempre estiveste, pertinho de nós. E desejo muito que isso seja verdade, sabendo na realidade que não o é. Queria acordar deste sonho mau. Ninguém se habitua ao facto de ter perdido quem ama. Nem que passem mil anos. E eu cumpro, todos os dias, todos, me lembro de ti. Uns dias choro, outros faço um sorriso, mas todos os dias me lembro, todos os dias vives em mim.