Mil dias, num só dia

Tenho dias cinzentos e outros com raios de sol. A grande parte do tempo, finjo que vivo no meio de tons pastel. Limito-me a respirar, a não pensar. Pensar não é bom. Faz-nos sentir. Sentir a dor, a perda a falta, dói. Tento não me lembrar. Sim, sou assumidamente uma pequena pessoa, fraca. Opto pelo mais fácil, o enganar-me. Engano-me, para não sentir. Para não chorar. Todas os dias, nesse dia, finjo viver que está ali. E ela não está. E o não estar, o sentir a falta, a saudade, torna tudo mais escuro, mais doloroso, torna tudo muito só. O nunca, deixa-me desolada. E recordo-me de coisas, que já não tinha lembrança. Que estavam lá longe, guardadas dentro de mim. Todos os dias neste dia, elas aparecem na minha cabeça. O sorriso, uma palavra. Quando faço coisas banais, e lembro-me que seria para ela, que seria por ela. E vem aquela aflição que nos aperta o coração. E eu faço um esforço para fingir que vai tudo ficar bem. Faço um esforço para pensar, que ainda vou rir, genuinamente de felicidade. E tudo me parece muito sem sentido. E penso, faço um esforço, para que o meu eu, sare e volte a viver, a querer viver. Um eu que vive vários dias, num só. Que anda numa montanha de emoções. E é dificil. Mia Bella, Mia Bella. Com um sorriso que nunca esquecerei. Dias cinzentos estes, cobertos de aguaceiros, que teimam em não deixar o sol brilhar. Que tudo mudou, quando não tinha que mudar.