Memórias de outra vida

As viagens que fazia de comboio para a terra dos meus pais, não me sai da memória. Até parece que sinto no corpo, o movimento do comboio sobre as linhas. Como sentia sempre, na primeira noite que o meu corpo descansava. A paisagem que vive na minha memória é lindíssima. Seguir ao lado do rio, do Porto à Régua, era algo maravilhoso. Podia dormir parte da viagem, mas parte do trajecto do Porto à Régua, tinha de ir acordada, de olhos postos no rio. Ficava sempre deslumbrada pela natureza, o brilho e a cor. Sempre.



Em miúdos, vamos identificando os lugares, e pequenos pontos de referência. Vivia sempre na excitação de que chegasse o Agosto, de chegar àquela terra, com primos que viviam distantes e os sentia tão perto. De chegar perto daquele amor puro e inocente, do primeiro amor. Com os olhos postos na janela, esperava sempre encontrar o prédio dourado. Sabia perfeitamente que se avistasse o prédio dourado, faltaria muito pouco para o comboio parar. Avisava sempre os meus pais, como se eles não soubessem, como fosse eu a única a saber o caminho e a paragem daquela terra mágica. 



E a confirmação chegaria sempre, sempre com o avistar do senhor da capa preta. Que na altura não percebia bem, mas sempre o identifiquei como tal. 
Quando o via, sabia que tinha chegado. E pulava de alegria, ficava eufórica. E dizia sempre "como está o senhor?"


Chegávamos e abraçávamos os nossos. Acho que foi com eles que aprendi, que a distancia é apenas física e não no coração. Quando os via, sentia que tinha estado com eles dias antes. Nunca fui de telefonar muito, mas quando estou com eles, sou exactamente eu. A mesma miúda de sempre e eles os meus de sempre. 

Fecho sempre os olhos, no caminho que me leva a casa. A minha segunda casa. Olho e tento absorver tudo, perceber as diferenças, e sinto que aquela terra mágica para no tempo. E olho, olho, com saudades, com vontade de beber tudo o que vejo. Sei aquele caminho de cor. Como se tivesse vivido estes anos todos naquela terra. Gosto de fazer a minha vida por lá, gosto de andar sozinha por sucalcos, gosto de voltar a sentir sensações que por vezes são impossíveis de repetir....mas tento, para que a outra vida, seja sempre esta.









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