D. Amélia
A D. Amélia é uma Senhora de 70 anos, muito bem disposta, energica, bonita e muito bem cuidada. Gosta muito de roupa, diz-me muitas vezes que trabalhou em grandes empresas de confecção e nota-se o gosto de conjugar o modelito. É uma pessoa que se lança a qualquer tipo de trabalho, que ajuda quem precisa. A D. Amélia têm um grave problema nas mãos, não pode usar detergentes, mas diz que se recusa a trabalhar de luvas. A D. Amélia nãó é respeitada como devia, pelo menos na minha opinião. Na minha opinião as pessoas confundem a responsável pela limpeza de um espaço, com criada pessoal. E isso não se faz. Vejo mulheres de 30 e 40 anos, que optam por trazer almoço, deixar a própria loiça para a D. Amélia arrumar, nem que a D. Amélia só venha no dia seguinte.Nem que a D. Amélia venha com as mãos em gaze, porque têm os dedos infectados. E isto deixa-me triste. Porque a D. Amélia apesar de alegre e bem disposta, têm a vida dificil, e não pode deixar de trabalhar. Porque a D. Amélia desde pequena aprendeu que o serviço bem feito, era sem luvas. A D. Amélia quase todos os dias me trás um mimo, sem lhe pedir. Pergunta-me sobre os meus e nunca se esquece deles. A D. Amélia vai a Fátima e trás-me um miminho. A D. Amélia é assim, meiguinha, amorosa, sabe acarinhar as pessoas. Eu tento fazer o que posso para retribuir, não que ela me peça, mas porque ela também precisa de ser acarinhada. Gosto de falar com ela e faço questão que partilhe comigo as suas angústias. Os amigos são assim, e eu não sou diferente, acho que cada um têm em si o poder de ajudar o outro, se não, de o animar. E custa-me muito o que oiço. Custa-me olhar para uma mulher com 70 anos, que já teve ameaças de avc e sentir todo o sofrimento que passa sózinha. Uma mulher que devia estar descansada, gozar a velhice. A D. Amélia têm uma filha que por razões dela se casou e teve três filhos. Separou-se. O genro revelou-se, partiu literalmente a cara da filha da D. Amélia. A filha da D. Amélia teve de levar uma protese. A D. Amélia já foi agredida pelo genro. A D. Amélia por ser tão boa pessoa, teve quem a apoiasse e ofereceu uma casa à filha e aos netos. A D. Amélia equipou a casa à filha, esperançada num novo dia. A Filha da D. Amélia, foi encoralada pelo marido e espacanda. A Filha da D. Amélia foi à policia e a policia não pode fazer nada, a agressão tem de ser em flagrante. A D. Amélia todos os dias chega ao pé de mim a chorar, que não sabe o que lhe espera, que têm medo de perder a filha. A D. Amélia tem uma depressão, e anda completamente dopada. Mesmo assim, vêm ver-me de óculos de sol, para que ninguém repare nas olheiras de tanto chorar e mostra sempre um sorriso. Cheguei de férias e percebi que a D. Amélia não esteve cá. E não é normal, a D. Amélia passa sempre por cá. Liguei. A D. Amélia não fala coisa com coisa, percebi que estava completamente dopada. A D. Amélia está desfeita e desesperada à espera que o telefone toque. A filha da D. Amélia despareceu desde ontem, a casa dela está cheia de sangue. Desapareceu a filha e os três netos. A policia judiciária não deixa a D. Amélia entrar em casa da filha, por não existirem condições. Ninguém merece, uma mãe não merece. A D. Amélia diz que está farta de sofrer e que para ela não faz mais sentido viver. Tento falar tudo, tento ...tento...e não me sai nada, porque nada é suficiente. E custa-me vê-la assim, custa muito, ver assim, uma mulher que está sempre pronta para tudo e todos e que já precisava de descansar, de ser feliz, sem preocupações. Não há limites para o sofrimento. E só agora a policia interfere. Tudo isto é de lamentar. Gosto muito da D. Amélia e corta-me o coração vê-la assim.
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R.