Há dias, que não são dias

Dou por mim, a dizer às pessoas que no caso de perda...não há como nos sentirmos melhor. Esta é a verdade. A morte, nunca nos vai ser aceite. Nunca vamos conseguir ficar confortáveis com o perder. Nunca. Há um hábito à falta da presença, à saudade. E a saudade é enorme. Quem perde, não conta os anos de perda, porque é como se fosse ontem. Hoje eu percebo isso. Quando falava com as pessoas, sobre a saudades delas, da perda de alguém...pensava que tinha sido recente...depois eram 10 anos, 20 anos, 30 anos.
Chego à conclusão, que será sempre recente. Que ficará sempre impressa no nosso coração, na nossa cabeça.
Não são poucas as vezes, que penso tenho de ir contar isto à minha mãe. E depois lembro-me que ela não está.
Sim, posso falar com ela, porque sei que está sempre comigo. Mas sinto falta de colo.
Sinto falta de lhe dizer o quanto me custa certas coisa. Sinto falta de ela me puxar as orelhas, e fazer-me sentir firme.
Sinto muita falta dela.
Quando falo com pessoas mais velhas, penso sempre, a minha mãe poderia ser assim. Que poderia ser a minha mãe, a ter aquela conversa comigo. Poderia ser a minha mãe, sentada no Borges comigo, a tomar o pequeno almoço. Depois afagava-lhe a mão e o rosto. Dava-lhe beijinhos.
Dou por mim a conduzir, vejo senhoras a passar na estrada, e penso....poderia ser a minha mãe. Aquele casaco, aquela saia, aquele jeito despachado. Podia ser a minha mãe.
Dói mais quando vejo essas senhoras com netos. Sempre imaginei isso. A minha mãe a passear com o meu filho, a minha mãe a ficar com o meu filho. O sorriso que ela fez, quando pegou pela primeira vez no meu filho, ficará sempre comigo.
Queria a minha mãe.
Queria muito chegar a casa, deitar a cabeça no colo dela, e chorar. Chorar de tanto me sentir cansada.
Queria dizer-lhe que ela tinha toda a razão. Que eu iria sofrer, com alguém assim ao meu lado.
Acertou, mesmo sem o saber hoje.
Os pais sentem, dizem.
Queria muito, não ter que falar, e ter só colo.
Queria abrir o portão, e vê-la sentada na cadeira de ferro, a apanhar a fresca da tarde.
Queria ouvi-la a dizer " a minha bela "
Queria muito ouvi-la sorrir
Queria-a tanto de volta.
Há dias tramados.
Há dias que os maus, não nos dão tréguas.
Há dias, que sei que deveria ter ouvido a minha mãe.
Há dias, que não são dias.

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