Podia falar de tanta coisa

Podia falar das muitas sms que apanhei numa factura deitada no lixo, enviadas por quem partilha a vida comigo para outra pessoa. Podia falar da indiferença que recebi. Poderia falar da dor de não receber afeto, e ver esse afeto dado a terceiras. Podia até falar da dor e do medo de ser enganada. Podia até falar na confusão que vai a minha cabeça e da dor que vai no meu coração. Podia até falar nos meus medos, nos meus receios, no meu mundo meio perdido. Podia até falar na agressividade com que me falam, quando confronto com perguntas. Podia falar numa insegurança que nunca tive. Podia até falar, que me sinto talvez mais só, do que alguma vez me senti. Podia até falar que se calhar vou passar por aquilo de que muitos me acusaram. Podia até falar que é duro ver e imaginar muitas coisas. Podia até falar que passaram 10 meses da morte da minha mãe, e parece que foi ontem. Podia até falar de que todos os dias choro baixinho, para mim, e que pergunto à minha mãe o que devo ou não fazer. Podia até dizer que todos os dias peço para a minha mãe voltar para mim. Podia até dizer que é mesmo verdade, que quem perde é quem sabe. Podia tentar ser menos egoista, se não doesse tanto. Podia fingir não estar tão desgovernada no que sinto. Podia até falar do meu medo com o Natal que se aproxima. Podia até dizer que vou fazer um esforço para sorrir neste natal. Podia até dizer, que não sei como se comemora uma passagem de ano, se a nossa mãe faleceu a 31 de dezembro. Podia dizer, que um dos piores dias da minha vida será sempre o dia 31, quer dizer por agora. Podia até dizer não sinto, o que sinto. Podia até dizer que temo as comemorações que ai vem. Podia até dizer que temo tudo o que aí vem. Podia até dizer que se a vida me contasse o que se passa hoje na minha vida, eu não acreditaria. Podia contar que para me safar do estado em que me encontro, acredito piamente que a minha mãe está comigo, e que me vai ajudar em tudo o resto. Podia dizer o quanto lamento não ter percebido a falta que ela me fazia. Lamento. Podia dizer isto tudo. Mas prefiro dizer que tenho um filho lindo, que já sabe escrever o nome, a data e que diz que me ama muito. Que me contou que tem namorada, como funciona o namoro dele. Que partilha as coisas dele comigo, como companheiros. E isso, só isto faz-me imensamente feliz. E agradecida.